ione saldanha
alegrete, RS — 1919
Rio de Janeiro, RJ — 2001
sobre
Ione Saldanha foi uma artista plástica nascida no Rio Grande do Sul e radicada no Rio de Janeiro. Nascida em uma família bastante envolvida com a política gaúcha durante o período da Revolução de 1923, Ione teve uma infância agitada até os 11 anos de idade, quando em 1930 sua família se muda para o Rio de Janeiro onde seu pai assumiria um cargo no governo de Getúlio Vargas. A mudança para uma cidade de clima tropical, na época capital do país e das artes, fortalece na jovem Ione o desejo de tornar-se artista. Seu primeiro contato com a pintura é por meio dos artistas franceses do final do século XIX, sobretudo Paul Cézanne (1839 – 1906) e Henri Matisse (1869 – 1954), tendo este último influenciado profundamente sua obra ao longo dos anos.
Antes de iniciar seus estudos formais em pintura no atelier de Pedro Correia de Araújo, em 1948, Ione produz uma série de obras de caráter experimental, com aspecto muito distinto dos caminhos estilísticos que viria a seguir anos mais tarde. Poucas obras dessa fase sobreviveram até os dias de hoje, uma vez que a própria artista destruiu dezenas de telas antes de sua segunda ida à Europa, em 1949, no desejo de criar uma tabula rasa para sua obra. Além dos pós-impressionistas franceses, Ione é profundamente influenciada pelo casal de artistas Árpád Szenes (1897 – 1985) e Maria Helena Vieira da Silva (1908 – 1992), que conhece no Rio de Janeiro durante o período da Segunda Guerra Mundial. A artista voltaria à Europa em 1951 para dar continuidade na sua formação, tendo estudado a técnica de afresco na França e na Itália.
Pode-se dizer que a obra de Ione evoluiu ao longo dos anos de forma a buscar a essência das formas, das cores e dos suportes. Na década de 1950, ainda durante sua fase figurativa, a artista trabalha fortemente com a temática das cidades. As metrópoles idealizadas por Ione em nada se parecem com o Rio de Janeiro do século XX – tem aspecto colonial, são pacatas e vazias. Ainda nos anos 1950, as cidades de Ione começam a flertar com o abstracionismo formal e informal, ao passo que a artista passa a produzir suas obras em cima de objetos já existentes, como bobinas de armazenar fios elétricos, bambus e ripas de madeira. O ready-made de Ione é dotado de intenções diferentes das de Marcel Duchamp (1887 – 1968): enquanto este buscava questionar o status de intocável dos objetos artísticos, Ione estava mais preocupada com a busca da essência: “só me interessavam as verticais de cores, e sobretudo ficar com o mínimo: uma ripinha encostada na parede, eliminando o rodapé”. Nesses objetos tridimensionais, a artista elevou ao máximo o papel da cor pura como criadora de ritmo, criando quase que partituras verticais e longilíneas.
A artista, que produziu ininterruptamente ao longo de toda a vida, tinha personalidade curiosa e ao mesmo tempo seletiva. Não pertenceu a escolas, grupos ou movimentos, se manteve distante de discussões políticas – quando muitos artistas da sua geração se engajaram nos embates contra a ditadura militar – e frequentou círculos de amizade restritos. Não obstante sua introversão, alcançou amplo sucesso comercial e institucional no meio artístico, tendo participado de 13 Bienais de São Paulo, com sala exclusiva em duas delas. Em 2024, a artista participa pela primeira vez da 60ª Biennale di Venezia, com curadoria de Adriano Pedrosa.